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a saga

gabriela perigo

garupa edições

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O golpe veio em nossa direção, em pequenas ondas. Em manhãs como outras qualquer, apoiamos nossos olhos no espelho e, no reflexo, assistimos tudo aquilo que não tratamos e está bem recalcado no corpo: pandemia, ditadura, escravização, colonização. Neste país, o trauma é a refeição do dia e esquecimento é o cafezinho pós-almoço.

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A desgraça nos acometeu: direitos trabalhistas foram destruídos, a fome foi devolvida para 33 milhões de pessoas, enterramos milhares de corpos em valas comuns, os escândalos pararam de revoltar. A desgraça tornou cada um de nós um corpo arrasado, fadado a doer, chorar e morrer em um país sem fundo, sem futuro. Em A saga, Gabriela Perigo faz poesia diante da catástrofe. Por um lado, há uma coleção de cenas repugnantes do Brasil. Por outro, há o corpo e os corpos que precisam sobreviver a esse país.

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Em casa, você tenta desenhar um futuro engraçado para os pets já que a aposentadoria não vem. na rua, um pastor abre a braguilha e a bíblia e tenta convencer, você, sapatão orgulhosa, do contrário; no trabalho, a sua geração tem as coxas ardidas e não tem tíquete de alimentação. Gabriela Perigo traça a catástrofe posicionando muito bem os desastres, eles estão fora, mas também estão dentro e é impossível sair ilesa.

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“esquecer dos pés/mas não esquecer da travessia” esses dois versos são quase um mantra para continuar a saga brasileira. Não é a primeira vez e não será a última que tentarão sequestrar o que exala vitalidade neste país. Para quem nasceu com medo e esperança, houve uma longa travessia e ela continua pela frente.